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segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

“O senhor não acredita em Deus”

Sou cristão. Creio em Deus mais do que meus amigos imaginam. Se não gosto de ficar repetindo é para não afastar os que não pensam da mesma forma nem acreditam nas mesmas coisas que eu. Quando respondo a uma pessoa que não conheço muito bem, sou cristão, é tentando ser plural não singular. Isso é respeito.

Sou professor de História e por ter uma tendência ao marxismo e à "história vista de baixo", passo a algumas pessoas a falsa idéia de rebeldia, de insatisfação e de descrença em Deus. O que é uma grande injustiça, porque a Bíblia é sistematicamente usada nas minhas aulas, como livro sagrado que é, como fonte histórica e como amarração dos eventos históricos.

Alguns assuntos na história me emocionam e transformam minhas aulas em algo extremamente positivo (pelo menos é o que dizem por aí). Reforma Protestante, Revolução Francesa e Ditadura Militar são os preferidos. É a ocasião que julgo apropriada para descer a lenha no lombo dos safados usurpadores do povo, dos safados usurpadores do poder e dos safados usurpadores de consciência.

Dessa forma, despertava nos alunos a consciência crítica, e, penso eu, ajudava a formatar novas visões de mundo.

Tudo corria bem naquele ano. A prefeitura tinha dado um aumento, tinha reformado a escola e a Secretária de Meio Ambiente até prometera caixas para a coleta seletiva de lixo (coisa que nunca cumpriu).

Mas eu tinha uma aluna que não me suportava. Deveria ter uns treze anos, mirrada, de saias enormes, cabelos quase na cintura, sempre soltos, nunca ria, mas não me parecia triste. Suas notas beiravam o máximo e só não o atingiam porque faltava nela o conceito de participação.

Tenho o hábito de iniciar com uma prece, uma frase ou uma piada. Ficava observando-a: A prece ela parecia compartilhar, a frase ela anotava no caderno com uma caneta de outra cor, mas a piada, não havia uma que a fizesse rir.

Aquilo me incomodava demais. Qual era o problema? Busquei entre os colegas professores uma explicação. Com eles não havia problema, era alegre, atenciosa, normal.

Assim foi até o final do ano.
Quando na última aula pedi a eles que anotassem numa folha de papel o positivo e o negativo sobre nossas aulas de história e os que quisessem poderiam desabafar ela foi a primeira a pegar a folha e sem a menor dúvida começou a escrever. Foi a primeira e entregar.
Já em casa, venci a ansiedade e após ler todos, peguei seu texto.
Um lado inteiro da folha ela usou para me fazer elogios. Aprendera muito comigo, que as nossas aulas eram ótimas, que gostara de todas as frases, e até das piadas, mas não gostava de mim e apenas por um detalhe, que estava do outro lado da folha.
No outro lado apenas uma frase: “O senhor não acredita em Deus”. Se ela tivesse me perguntado...

Como deve ter sofrido em silêncio durante nossas aulas ouvindo minhas “heresias”, como deve ter orado pela minha alma na igreja, talvez confessado ao pastor sobre os perigos que sua fé estava correndo. Então, fui importante para o fortalecimento das suas crenças.

Nunca mais a vi. Hoje deve ser moça feita, e deve continuar com a mesma impressão.

Se tivesse me perguntado... Diria sem titubear: Acredito sim, minha filha, não talvez da forma que você ainda acredita, mas muito mais do que qualquer um possa imaginar.

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