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quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Vítimas e "vitimas"...

Julgar é das tarefas mais difíceis que existe. Também é das mais tentadoras, por isso muitos acreditam que é fácil. Acredito que a dificuldade está em identificar as vítimas. 

Há 3 meses a região do Juruá foi assombrada com a notícia de um caso de incesto no rio Gregório (veja reportagem no final da postagem).

No inicio desta semana, mais um caso. Dessa vez foi no Rio Liberdade onde um criminoso seduziu uma criança. Nos dois casos, um bom advogado encontraria em seus crimes tantas atenuantes que eles teriam grandes chances de absolvição. 

Não quero parecer conivente com crimes, mas também não consigo deixar de sentir pena da miséria a que a maioria dos moradores daquelas brenhas estão submetidos. 

A mesma justiça que libertou no mês passado um covarde morador do mesmo rio que assassinou um policial militar no exercício da função, agora demonstra toda a sua bravura e rigor. 

Não discuto a legalidade em nenhum dos casos, mas quem praticou maior crime? Os estupradores das crianças(não assassinos efetivamente) ou o assassino do policial? 

Dirão os movidos à hipocrisia - "os estupradores, pois assassinaram a inocência e o futuro das crianças".

E eu me pergunto: Será que a esposa e os filhos do Sgt Francisnato que se orgulhavam dele, que dependiam dele e o viram sem vida dentro de um caixão e lembram dele com uma saudade que não tem cura, todas as horas do dia também não mereciam um melhor tratamento? Será que o seu assassino já deveria estar solto, já gozar de uma liberdade que pode ser definitiva?

Ninguém vai conseguir me convencer que um estupro deva ser tratado com mais rigor que um homicidio. Nada, nada se compara ao valor de uma vida, nem mesmo o estupro. Ao Sgt Francisnato foi negado o direito de ter sofrido uma violência e recomeçar a vida, naquele caso é fácil identificar a vítima e o autor.

Nos dois casos de estupro, para a justiça também parece não restar dúvida e os estupradores, os "sádicos estupradores" rapidamente são atirados na penitenciária.

Já no caso do Sgt assassinado...

Antes de julgar criminosos estupradores moradores dos altos rios se faz necessário avaliar várias possibilidades.

Uma delas é a geografia.
Desde criança que ouço falar nos rios Boa Fé, Gregório, Jaquerana, Liberdade e outros tantos rios, como lugares de homizio, para onde os criminosos se refugiavam seguros da impunidade, dada a distância e o dispêndio para caçá-los.
Ali, diziam, os cabras amolam o terçado pelos dois lados e usam como espada, puxando de trás das costas como os cavaleiros medievais. E festa para ser boa tinha que morrer pelo menos um...
Um retrato colorido, com milhões de pixels, do que fomos há talvez cinquenta, setenta anos. 
Outra é a omissão do poder público do nosso país. 
Na maioria desses lugares, a justiça que chega, quando muito, é a justiça eleitoral. E nenhum outro direito de cidadania sequer de trabalho. 
No caso do estuprador do Gregório, vinte anos levaram para tomar conhecimento da violência ali praticada no alto do barranco. Tanto tempo que a criança se fez mulher e mãe de seis filhos. Vinte anos de convivência...
Imagem: Site Juruá Online
Vinte anos de conhecimento e omissão de todos no rio, da família, da mãe (ex-esposa), dos barqueiros, dos políticos donos dos rios, dos caçadores, dos mercenários que trafegam por ali. Vinte anos...
Ali, o estado chegou uma única vez em 20 anos. E como tivesse chegado atrasado porque "é muito longe e talvez não desse para voltar com o dia" resolveu rapidamente, ao pé da pela letra fria da lei. 
Prendeu, resgatou, arrebatou e deve julgar severamente um miserável que mesmo sem ter sido ensinado, sem nunca ter frequentado escola, deveria conhecer a lei.
Deveria conhecer a lei... Nem Deus com o povo no deserto foi tão implacável. Nem Deus...
No Brasil oficialmente não existe pena de morte, entretanto, quando absolve político que rouba remédio, merenda escolar, que desvia, que usurpa, indiretamente legaliza-a.
Minha hipocrisia me faz desejar para os "facínoras estupradores" dos altos rios a pena de morte. Pelo menos nesses casos, pois suas "sandices, insanidades, poucas vergonhas e imoralidades" nos envergonham, mostrando ao mundo o que fomos (e ainda somos em vários lugares), desnudam nossas práticas "civilizatórias" na época dos seringais, onde a maioria dos coronéis seringalistas e seus filhos eram os primeiros a "usar"(para usar o mesmo verbo que o estuprador dessa semana usou para dizer que copulou com a menina) as filhas dos seringueiros, a ultrajar suas famílias.
As vítimas dos estupros terão (eu espero) toda a atenção e preocupação das autoridades. Psicólogos e especialistas em violência infantil talvez publiquem uma tese sobre a violência contra menores no Juruá. É bem possível.
Pois bem, quanto aos assassinos do Sgt Francisnato foram  defendidos com a tese de potencialmente insanos e na ausência de um  simples laudo médico que atestasse ou não a possibilidade, foram liberados para retornar ao convívio da sua comunidade. 
Eles dispararam e mataram um policial sabendo que era um policial, mas possivelmente são loucos...
Meu Deus, será que manter a filha como mulher cativa, na miséria por 20 anos não é ser completamente louco? Pela mesma presumível insanidade libertem também os pedófilos do Gregório e  do Liberdade.
Não sou advogado, não tenho estômago e nem formação acadêmica para tal, mas se fosse, gostaria de fazer a defesa pelo menos do criminoso do Gregório. 
Que fique bem claro, não estou isentando os estupradores do peso da culpa, mas é que certas coisas me revoltam.

Veja as reportagens do Juruá Online  
Preso ribeirinho que sequestrou, estuprou e engravidou a filha seis vezes
Homem é preso vivendo maritalmente com menina de 11 anos

Um comentário:

Jairo, o Nolasco disse...

Este é o nosso Estado Democrático de Direito no qual os pobres coitados dos assassinos são transformados em vítimas em nome da tal 'dignidade humana'.Tá certo que devemos realmente preservar a vida sob quaisquer circunstância. O Estado não pode ser vingativo. Só não entendo porque a mesma dignidade humana não se estende à família daquele que perdeu a vida. E nesta estou com você: apesar do chocante ato que pai praticou contra a própria filha, a pessoa dele representa menos perigo à sociedade do que os frios assassinos do policial. Foi-se o tempo em que doido de verdade comia merda e rasgava nota de R$ 100,00.